quarta-feira, 4 de junho de 2014

Reveillon no deserto e 2ª maior montanha das Américas


Esta minha aventura aconteceu no deserto do Atacama, localizado ao Norte do Chile.
Considerado o deserto mais alto e árido do mundo!

O vilarejo de San Pedro do Atacama tem pouco mais de 3000 habitantes 
e está a 2400 mts de altitude.
Alí é possível encontrar viajantes do mundo todo!
Existem vários passeios super bacanas para a turistada fazer.
A foto acima é do Vale da Morte...  
(E este canion em especial parece aquele do desenho do "Papa Leguas"!)

Vale da Lua... O pôr do Sol aqui é simplesmente incrível!! As luzes ao entardecer misturada com as cores das montanhas fazem deste um momento único!

Gêiseres del Tátio
Estes gêiseres são formados quando rios gelados subterrâneos 
entram em contato com rochas quentes...

 ...as grandes colunas de vapor saem para a superfície através 
de fissuras na crosta terrestre, alcançando a temperatura 
de 85°C e até 10 metros de altura.
       
 Lagoa que secou deixando apenas o sal... 

Ojos del Salar: um buraco com água doce no meio do deserto

 que se transforma numa piscina deliciosa!

Só no deserto: típica praça de cidadezinha do interior, mas com

 cactos dando um charme especial... 

Rio com água quente...
A 3.500 m de altitude aflora a água termal do Rio Puritama, que significa “água quente” em Kunza, língua tradicional atacamenha. O contato com estas águas a 32ºC de temperatura é uma experiência super revitalizante!

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Estas são algumas atrações que a turistada encontra no deserto do Atacama , 

próximo ao vilarejo de São Pedro.

Só que, muita gente, turistas, hoteis, restaurantes, badalação... não fazem muito meu estilo... Estava na hora de dar uma pitada de adrenalina em minha viagem, então peguei um ônibus e viajei 800km para o Sul até a cidade de Copiapo!

Alí me encontrei com o guia chileno de montanha Rodnei e nos preparamos para escalar a

 segunda maior montanha das Américas: 

o Monte Ojos del Salado!! (6890mts)

Agora sim minha viagem estava começando!!


 FRIOZINHO NA BARRIGA Se o carro quebra ou atola 
em um lugar como esse, vai passar apuro!
Celular alí não tem sinal e quase não se vê carros passando.

TRANQUILIDADE PURA: Primeira parada para aclimatação: Lagoa Santa Rosa.
Passei a virada do ano neste lugar! Um dos melhores reveillons de minha vida!
COLORIDO INESQUECÍVEL: lagoa azul turquesa, flamingos rosas, montanhas nevadas de fundo com um marrom suave parecendo pintura de guaxe... Esse era o colorido do lugar.
À noite o céu era um espetáculo a parte por conta das estrelas "explodindo" no céu!
O deserto do Atacama´ é um dos melhores lugares para se estudar astrologia com 
um dos céus mais limpos do planeta. 

Parte da lagoa que secou deixando o sal à mostra.

carcaça de animal nos faz lembrar que estamos em terreno hostil.


ao meio dia o Sol transforma a lagoa num espelho. 

Fox, uma espécie de raposa da região que atacou nossa caminhonete de madrugada
 e comeu nossos pães e ovos.
Sem vergonha, no dia seguinte, ainda voltou à cena do crime! 

No dia seguinte fomos para esta outra lagoa, "Laguna Verde" que está a 4300mts de altitude.
Esta é bem maior do que a anterior e com  um peculiaridade bem interessante:

...nesta lagoa é permitido se banhar em suas águas geladas e salgadas...

...e depois, podemos  tirar o sal do corpo com um banho de água quente e doce nestas termas naturais logo ao lado da lagoa! Água doce e quente brotando do solo!!
Uma maravilha da natureza!!

Banheiro a céu aberto!

Vista super privilegiada ao sentar no trono!
(Explicando: a princípio existiam paredes ao redor destes vasos, mas o vento forte
 as levou deixando tudo mais "a mostra"!

No terceiro dia seguimos no meio do deserto rumo a um refúgio que se encontra à 20 km 
da montanha  "Ojos del Salado".
 E assim continuamos nosso processo de aclimatação...

estrada  no meio do deserto rumo ao Ojos del Salado.

Esta estradinha passa no meio de um vale cercado por montanhas
 com mais de 6000mts de altitude.
Um lugar especialíssimo com uma beleza e energia indescritíveis!!!

Um lugar completamente selvagem!

Sem luz, água, energia ou qualquer conforto da cidade. Apenas uma mesa, cadeiras e alguns colchões...
Este foi nosso lar por três dias enquanto subíamos a montanha durante o dia e descíamos para dormir numa altitude mais baixa. Tudo isso com o intuito de fazermos nossos organismos se acostumarem com a baixa taxa de oxigênio existente na altitude.
visual do pôr do Sol da varandinha de casa!
Neste lugar, pela primeira vez na vida, escutei o silêncio absoluto!
Senti meu tímpano pulsar... Não existia absolutamente nada ao redor!! Nem animais,
 nem máquinas, nem pessoas... Passar dias num lugar como este
 renova completamente o corpo, mente e espírito.
Vez ou outra aparecia no horizonte uma fumacinha se deslocando... Era um 
carro passando lá loonngee...
Uma gotinha de verde nomeio do marrom interminável... Vai entender...

De manhã, após algumas posturas de Yoga e exercícios respiratórios, 
visualizando o cume da montanha...

A MONTANHA SUMIU: Nos três dias que antecederam  nossa subida, o tempo fechava
 completamente ao final da tarde, fazendo a quantidade de neve aumentar
 consideravelmente e nos deixando nada tranquilos...

Resolvemos subir mesmo com a previsão não estando 100% a nosso favor.
Início da subida, estes coloridos pequenos são barracas montadas no primeiro acampamento, 5400mts de altitude...

O gelo começando a  aparecer... Estas formações chamam-se "Penitentes" 
e só existem nas montanhas da America do Sul.

Este container vermelho é nosso segundo acampamento, chama-se Tejos,
em homenagem a um piloto de helicóptero que pousou alí e não conseguiu
 mais subir vôo (devido ao ar rarefeito)...
 A tripulação e ele morreram congelados.

Como é normal em alta montanha, no dia de cume saímos de madrugada... à meia noite com previsão de chegada ao cume por volta das 8hs... Mesmo com muita neve seguíamos num ritmo bom, com o guia chileno na frente "amassando" neve enquanto eu, um canadence e um americano nos revesávamos atrás...
Depois de umas 4hs de subida, no meio da madrugada, começamos a atravessar uma area mais aberta, então o canadense começa a gritar: "Risk avalanche, risk avalanche!!" (risco de avalanche) O guia parou ,olhou ao redor e disse: "Ele tem razão!! Esses canadenses entendem bem disso! "
Fizemos uma rápida reunião e decidimos passar um de cada vez, técnica utilizada em áreas com este tipo de risco para, caso a neve desça e leve um de nós, os colegas podem ver para onde este foi arrastado e tentar cavar para resgatá-lo! " A brincadeira está ficando séria..." pensei.
Logo depois desse trecho o percurso ficou bem íngrime e a neve mais volumosa... Ao pisar afundava a perna quase até os joelhos e percebia que a neve estava bem instável... Me lembrei do Chimborazo, quando por muito menos o guia disse que deveríamosvoltar! Então parei e gritei para o guia: "Hei Rody!! Estou achando essa neve muito perigosa!

 Na volta, quando o Sol estará forte, não existe risco de avalanche?? "
Ele parou, respirou fundo e disse: "bem... existe um certo risco sim!..."
"certo risco??! Acha que devemos continuar?"
Para minha surpresa ele diz: "Podemos subir sim, você que escolhe!"
Respirei fundo, pensei em tudo que passei para estar alí: treino, viagem, dias aclimatando... "deve ser difícil de dar avalanche aqui!" pensei. "Quer saber, vamos tocar pra cima!!" gritei.

 Então aconteceu algo bastante interessante... Após autorizar o guia a continuar a subida dei dois passos e senti um aperto no peito... lembrei de meus famíliares e ouvi uma voz em minha mente que dizia: "os que foram pegos por avalanche também pensavam que as chances disso acontecer eram mínimas, ou que isso não aconteceria com eles..." Então imediatamente pedi para Rody parar, me aproximei dele e disse olhando nos olhos, com a voz emocionada... "quer saber, vamos voltar! Não vale a pena o risco! Quero voltar para minha família!!" e dei meia volta e comecei a descer... Ele bateu em minhas costas e disse: "Você está certíssimo!!"
Senti que por um momento a tal "febre do cume" (aquele sentimento que faz os montanhistas negligenciarem todos os riscos para atingir o cume) o tinha dominado. Ou talvez a vontade de receber o "Summit tip" (gorjeta pelo cume) tenha contribuído para tal negligencia ao risco.
 Logo encontramos o canadense e o americano, explicamos que estávamos descendo... Eles retrucaram, mas percebi que o canadense estava com o rosto todo roxo de frio e já não estava falando coisa com coisa (mal da altitude deixando a pessoa confusa). Os deixamos falando sozinhos e continuamos a descida... Depois de minutos vieram atrás de nós.
Desistir da subida estando forte fisicamente e mentalmente foi difícil mas sinto que, fazendo isso, subi mais um degrau na evolução do montanhismo.

 Afinal de contas, é a Natureza que decide sempre.

contato:

alexandre.haigaz@ig.com.br